Jovens resgatam câmeras digitais e celulares flip

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A Geração Z está redescobrindo tecnologias que pareciam esquecidas. Câmeras digitais, celulares flip, CDs e discos de vinil voltaram a ganhar espaço entre jovens de 17 a 25 anos, que cresceram em um mundo dominado por smartphones, redes sociais e streaming. O movimento, segundo reportagem do The Wall Street Journal, é impulsionado por um desejo crescente de reduzir o tempo de tela e retomar o controle sobre o consumo digital.

A tendência, que mistura nostalgia tecnológica e crítica ao imediatismo digital, também vem sendo incorporada pela indústria da música. Artistas populares entre o público jovem, como Taylor Swift, Sabrina Carpenter, Alex Warren, Troye Sivan e Chappell Roan, estão relançando seus álbuns em formatos físicos, CDs, discos de vinil e até fitas cassete. Em alguns casos, os músicos chegam a vender CD singles, um produto praticamente esquecido desde o início dos anos 2000.

O fenômeno se estende às redes sociais. No TikTok, proliferam vídeos de usuários mostrando tocadores de CD com Bluetooth, câmeras digitais compactas, celulares flip e coleções de mídias físicas. Muitos jovens tratam esses objetos como símbolos de identidade, associando-os a uma vida mais autêntica e menos dependente de plataformas e algoritmos.

“As pessoas, especialmente da Geração Z, estão cansadas de não possuir nada”, afirmou ao WSJ Hunter White, engenheiro de dados de 25 anos e um dos chamados “nerds da música da internet”.

White coleciona CDs para escapar do domínio dos serviços de streaming, que, segundo ele, pagam mal aos artistas e oferecem catálogos inconsistentes. Ele compra discos em brechós, feiras e lojas de usados e os escuta em um aparelho da Sony lançado em 2002. Para compartilhar o hábito com outros entusiastas, criou o Dissonant, um aplicativo que funciona como um clube de assinatura de CDs: os assinantes pagam uma taxa para receber um álbum físico pelo correio, acompanhado de um bilhete escrito à mão sobre o disco. Depois, podem ficar com o CD ou trocá-lo por outro gratuitamente. O projeto conta hoje com 800 discos catalogados e 350 membros ativos, a maioria na faixa dos 20 anos.

A busca por uma rotina mais analógica também aparece fora do universo musical. Lucy Jackson, de 17 anos, estudante universitária, decidiu abandonar o smartphone e hoje usa um celular flip que faz apenas chamadas e envia mensagens de texto. Ela também trocou o GPS digital por mapas de papel e liga para centrais de táxi quando precisa se deslocar.

“Passei a valorizar muito mais as coisas que não posso acessar com um toque, como qualquer tipo de mídia”, disse Jackson, que integra a diretoria do Luddite Club, organização sem fins lucrativos que incentiva pausas no uso de smartphones.

Jackson lembra que ganhou seu primeiro iPhone ainda no ensino fundamental e que as redes sociais a faziam sentir que vivia “uma vida dupla”. “Havia a versão 3D, na vida real, em que eu era feliz e havia esse mundo 2D em que eu mostrava uma imagem de mim mesma. Era tudo falso”. No primeiro ano do ensino médio, conheceu colegas com ideias parecidas e comprou seu primeiro celular de flip. “A forma como eu ouvia música mudou drasticamente. Navegação passou a ser um problema real. Para a escola, eu tinha que estar realmente organizada.”

Outro símbolo desse movimento é a câmera digital, que vem ganhando força entre jovens criadores de conteúdo e influenciadores. Há até uma piada recorrente no TikTok de que todo grupo de amigos tem “o amigo da câmera digital”, aquele responsável por registrar os momentos, trocar os cartões SD e cuidar dos adaptadores. Recentemente, Kendall Jenner publicou uma foto feita com uma Canon PowerShot, reforçando a tendência.

A designer Tumasi Agyapong, de 26 anos, contou que começou a usar câmeras digitais há dois anos, movida pela nostalgia e pela simplicidade desses dispositivos. “Adoro o fato de que elas servem para um único propósito, sem as distrações do celular”, disse. “Isso vem mesmo dessa vontade de fazer um detox do celular ser meu tudo.”

Uma pesquisa conduzida em 2023 pela The Harris Poll em parceria com o Human Flourishing Lab confirma o sentimento geral: 80% dos jovens da Geração Z acreditam que estão excessivamente dependentes da tecnologia, e 60% afirmam que gostariam de voltar a um tempo em que ninguém vivia conectado.

“Eles estão fazendo esse curioso exercício de equilíbrio”, disse Clay Routledge, pesquisador responsável pelo estudo. “Eles gostam de tecnologia, mas sentem que estão perdendo algo e querem ter mais controle sobre a forma como a usam.”

Esse movimento de “volta ao analógico” mostra que, para a nova geração, a relação com a tecnologia está mudando: não se trata de rejeitá-la completamente, mas de encontrar um ponto de equilíbrio entre o mundo digital e experiências mais tangíveis — onde ouvir um CD, tirar uma foto ou segurar um celular com teclas físicas volta a ter valor emocional e cultural.

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